sexta-feira, 20 de março de 2020

«Aula» de quarta - o sumário possível

1. Sobre a tradução
Os exercícios de tradução de rimas são tramados. Ser fiéis a quê, som ou sentido? Eu voto sempre por seguir esta lei: a língua de chegada é a mais importante. Por isso fiquei zangado com a Disney quando, numa arrogante decisão de direitos, passou a obrigar as crianças a dizerem 'Goofy' em vez de Pateta, por exemplo. Não há que ser draconiano nem aplicar regras estritas, mas o aportuguesamento da história parece-me fazer algum sentido.

Um bom tradutor consegue traduzir decentemente dentro de um prazo mutuamente acordado. Ao contrário do escritor, que tende a falhar prazos das encomendas, o tradutor que quer ter sucesso cumpre prazos.
Ora, o que fazer quando a tradução literária (a mais nobre) é a mais pobre em pagamento? Não há soluções mágicas, mas o tradutor tem de se proteger duplamente:

  • a) não trabalhar de borla e a certa altura passar cinco horas à volta de uma página para ganhar oito ou dez euros, o que tornará mais rentável ir limpar casas; 
  • b) não desligar logo o taxímetro mal chegue à hora que se comprometeu mentalmente a dedicar àquela página - trabalho algum intelectual seria terminado assim (corrigir testes, por exemplo) e, pior, se formos incompetentes muitas vezes perderemos ofertas e ganharemos má fama. 

A boa notícia é que com a prática e o gosto a coisa melhora. Além de que nem sempre o texto a traduzir é terrivelmente complicado. Eu sugiro - comigo funciona - ir alegremente e, quando houver um obstáculo, colocar a vermelho [acrescentando um par de hipóteses, se já as tenho] e e deixar para depois. Contudo, mesmo nas partes que achámos ter traduzido bem, mais de uma releitura é necessária.   

E cabe depois ao editor reler a tradução - e sentir, com o seu olfacto de princesa ervilheira, se algo soa errado.

2. E porque hoje é sexta-feira

Para quem teve dificuldade em traduzir o Pierre, aqui vai um exemplo de uma reinvenção da mais espantafantastástica letra de Cole Porter:


Let's Do It 
Birds do it, bees do it
Even educated fleas do it
Let's do it, let's fall in love
In Spain, the best upper sets do it
Lithuanians and let's do it
Let's do it, let's fall in love
The dutch in old Amsterdam do it
Not to mention the fins
Folks in Siam do it, think of Siamese twins
Some Argentines, without means, do it
People say in Boston even beans do it
Let's do it, let's fall in love
Romantic sponges, they say, do it
Oysters down in oyster bay do it
Let's do it, let's fall in love
Cold cape cod clams, 'gainst their wish, do it
Even lazy jellyfish, do it
Let's do it, let's fall in love
Electric eels I might add do it
Though it shocks em I know
Why ask if shad do it, waiter bring me
"shad roe"
In shallow shoals english soles do it
Goldfish in the privacy of bowls
Façamos (Vamos Amar)
Os cidadãos no Japão fazem
Lá na China um bilhão fazem
Façamos, vamos amar
Os espanhóis, os lapões fazem
Lituanos e letões fazem
Façamos, vamos amar
Os alemães em Berlim fazem
E também lá em Bonn
Em Bombaim fazem
Os hindus acham bom
Nisseis, níqueis e sansseis fazem
Lá em São Francisco muitos gays fazem
Façamos, vamos amar
Os rouxinóis nos saraus fazem
Picantes pica-paus fazem
Façamos, vamos amar
Uirapurus no Pará fazem
Tico-ticos no fubá fazem
Façamos, vamos amar
Chinfrins, galinhas afim fazem
E jamais dizem não
Corujas sim fazem, sábias como elas são
Muitos perus todos nus fazem
Gaviões, pavões e urubus fazem
Façamos, vamos amar
Dourados no Solimões fazem
Camarões em Camarões fazem
Façamos, vamos amar
Piranhas só por fazer fazem
Namorados por prazer fazem
Façamos,

1 comentário:

  1. Adoro essa versao em portugues (perdao, estou em um teclado sem acentos)! Apenas uma correcao: os creditos indicados sao dos interpretes - maravilhosos -, mas a versao foi feita pelo Carlos Renno.

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